Tuesday, October 16, 2007

14 de outubro

Daqui ela não sabe mais o que quer. Tenta focar, estabelecer prioridades mas a maresia a confunde. Quer a brisa, ela sabe. Quer o sol, o vento nos cabelos, o sal no corpo. Mas quer com quem? Sozinha não é suficiente, ela rege sua própria orquestra de um só instrumento; sua voz é apenas sua. Movimenta-se entre um lado e outro do desejo – há alguns desejos que deveriam ser apenas latentes mas que tentam chegar à superfície nesta cidade que a acolhe como nenhuma outra. Não queria esse confrontamento aqui; bem que poderia ter acontecido em algum outro lugar, pra levar daqui a idéia de que há constrangimentos em que ela mesma se coloca. A fantasia de criança tentou crescer em um ano e ela não quis, empurrou lá pra dentro do armário, junto com os choros de ontem. A cidade não pode ter esse peso, ou pelo menos assim ela quer. Essa cidade tem que ser apenas diversão, apenas areias entre os dedos, apenas chuva de verão, apenas o lar em que ela sabe que pode estar em segurança. A vida não parece mais tão presa a alguns quarteirões; há vida lá fora. Neste momento, o lá-fora é a cidade cinza que traz uma perspectiva tão diferente quanto improvável – é possível ser feliz sem o vento nos cabelos? Fecha os olhos, imagina a brisa, sente a maresia nas lembranças e vai em frente. A bicicleta perdeu as marchas, enferrujou a corrente e suja o vestido de graxa, mas ainda a leva à beira da lagoa, ao pier do passado lindo e do futuro promissor onde se ouve Beatles e se vê a luz amarela nas folhas vermelhas. É só lembrar, sempre, que a bicicleta fica destrancada na garagem mas que, se precisar, a chave tá dentro da bolsa. Da bolsa dela.

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