Tuesday, October 28, 2008

subtexto

Sempre queremos ter todas as evidências da posição que ocupamos. Sempre. Carimbo na folha que diz "sou especial", com assinatura registrada em cartório e cuspe para comprovar, no amassado do papel, que o documento foi revisado por cinco pessoas que mal sabiam da verdade. Quanta formalidade para entendermos que aquilo não vale nada. É um papel, mera soma de cuspe e caneta e árvores mortas. Comparado ao olhar na cama, ao abraço em que o outro se acomoda perfeitamente nos seus braços e, quentinho, te ouve dormir. O que seria da poesia se tudo precisasse ser tão explorado por todos, tão claro paraomundointeiro, tão explícito, que não haveria nada de íntimo para colocar em entrelinhas. A intimidade que se constrói estando com a pessoa amada não diz respeito a muitos. Só quem ama sabe porque, e como, ama. Só quem é amado sabe reconhecer o amor nos gestos menos amorosos.

Prefiro me transformar na despistada sem glamour, sem faixa de eu te amo, sem flores na recepção, sem violinos na despedida.

Talvez eu prefira, mesmo, a autenticidade do telefone desligado na cara e do beijo na madrugada, de olhos fechados, sem ver teu rosto, mas sabendo que ele me olha mesmo sem ver.

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